quinta-feira, 25 de abril de 2013

MAURÍCIO, MEU FILHO. (I)


Neste blog, iniciado em fevereiro de 2011, constam episódios de minha vida pessoal, de fatos acontecidos na comunidade onde sempre vivi, das instituições escolares, assistenciais e de outras naturezas onde atuei, de um dos fragmentos de minha história familiar, na qual me deterei no capítulo de hoje.
De meu casamento em 1953, nasceram, Mauricio em 1954 e Marisa em 1960. Do casamento deles, cinco netos alegram os nossos dias: Leonardo e Gustavo da parte de Maurício e Cristina; Bruno, Luciano e Taís da parte de Marisa e Odilon.
De todos eles tenho recebido inequívocas demonstrações de amor e carinho. Hoje, no entanto, Maurício será o foco principal destas publicações, pelos acontecimentos que cercaram sua vida, pelas qualidades de liderança e dedicação nos trabalhos de cunho social a que se entregou como profissional de engenharia agronômica, e pela competência que lhe valeram sucessivos cargos de chefia nos núcleos regionais de agricultura e correlatos, tanto interioranos como da capital do Estado e finalmente pelo seu falecimento trágico em Moçambique, ex-colônia portuguesa no continente africano onde se encontrava em plena atividade, nos trabalhos de assentamento de refugiados de guerra e que o inseriram nos anais da  história da formação daquele país.
Seu último cargo, antes da partida para Moçambique, foi o de Secretário da Agricultura e Abastecimento do Estado do Paraná, assumido em substituição ao Sr. Jorge Sameck que se desincompatibilizara, para concorrer como candidato a deputado federal, em 1988, no final do Governo Roberto Requião. Encerrado o período governamental Maurício poderia voltar ao Instituto de Terras e Cartografia aos quadros do qual pertencia, ou atender convite partido da administração de outros estados para implantar neles o programa dos mercadões populares. Preferiu aceitar a proposta de seus dois grandes amigos, Joaquim Severino e Luiz Alberto Scorsin para trabalhar na empresa da qual eram titulares, a AGRÁRIA – Engenharia e Consultoria. Aceitou e meses depois, mais precisamente, em maio de 1989, embarcava para Moçambique.
Abro agora um espaço para falar de três pessoas, duas delas, Joaquim e Escorsin, grandes amigos do Maurício e que se tornaram amigos meus e uma terceira pessoa, o Sr. Sílvio Galdino de Carvalho Lima, que fora o companheiro de meu filho no denominado Projeto Nhamatanda destinado a atender milhares de famílias deslocadas pela guerra e assentadas em condições precárias numa área denominada Corredor de Beira. Eu só conhecia o Sílvio pelo artigo por ele escrito e que foi publicado no “Informativo Agronômico”, em agosto de 1989, com o título “UMA VIDA PELA PROFISSÃO”. Nele, Sílvio traça o perfil do Maurício em atividade. Destaco esta frase: “Seu jeito muito brasileiro de ser, comunicativo e alegre, cativou muito fortemente todos os seus interlocutores. Testemunho vivo disso foi o que ouvi do seu contraparte, principal auxiliar direto, Francisco Mangolange descrevendo a emboscada na qual ele tomara parte sentado ao lado de Maurício, onde chorando disse: “quisera ter sido eu em lugar do Maurício. ”Só vim a conhecer pessoalmente o Sílvio quando ele, já de volta ao Brasil, foi-me apresentado quando  participávamos ambos  de uma cerimônia religiosa em favor do Maurício. Esse encontro e mais o “Diário de Moçambique” de autoria dele que eu teria em minhas mãos, anos mais tarde, geraram em mim, como não podia deixar de ser, fortes emoções.
Luiz Alberto Scorsin, já se encontrava em Moçambique preparando documentos contratuais e projetos para o início dos trabalhos quando lá chegaram Galdino e Maurício, para assumir a execução do projeto. Dias depois regressava ao Brasil encerrando assim a sua responsabilidade como introdutor. Scorsin foi o grande amigo com quem convivi por um bom tempo. Encontrávamo-nos de tempos em tempos em Curitiba, almoçávamos juntos, conversávamos muito procurando amenizar a dor da ausência do Maurício.  A minha como pai, a dele como amigo.
O artigo escrito por Joaquim Severino Intitulado BRASILEIROS NA ÁFRICA, publicado no jornal Indústria & Comércio, em Dezembro de 2011, em comemoração aos vinte e cinco anos de existência da AGRÁRIA, homenageia Galdino e Maurício  e dá-nos uma idéia dos resultados da execução do Projeto Nhamatanda que se evidenciou com o excedente  de seis mil toneladas na produção de alimentos e foi considerado pela Direção Nacional de Desenvolvimento Rural do país como referência exitosa de ação integrada e consequente. Fala-nos ainda que “coube a Sílvio Galdino, com a experiência e serenidade própria de um homem sábio, repatriar o corpo do colega e seguir adiante com o projeto, ao invés de desistir do mesmo como foi a ideia depois desse grande impacto.”
Imaginemos o que deve ter sido para os brasileiros, integrantes do projeto, primeiro pelo impacto da tragédia, depois pelas dificuldades para as providências relativas ao transporte do corpo para o Brasil. Houve até uma reunião com as autoridades moçambicanas para planejar como isso seria feito.
Ficou decidido que o transporte de Beira (onde estava o corpo) para Maputo, a capital, a mil quilômetros de distância, seria feito num taxi aéreo. Como o único avião disponível estava em Maputo a viagem seria de ida e volta. Viria para Beira já trazendo o caixão especial, a ser fechado e lacrado com a presença de quatro  autoridades. Tudo foi feito conforme o planejado.  Às 18:30, do dia 13 de julho de 1989, levando o corpo de meu filho, o avião decolou de retorno a Maputo e de lá, no dia seguinte, em avião que faria conexão com o voo da Varig, viajaria para o Brasil. O trabalho realizado pela equipe de Sílvio Galdino visando o embarque do corpo, é descrito no diário, passo a passo, hora a hora, minuto a minuto. O diário, por ser um trabalho meticuloso e revelador da situação na vida do país naquela etapa, é um documento histórico valioso.
Transportemo-nos agora para o Brasil. Aqui, como lá, a notícia só nos chegou no dia 12 de julho, uma quarta-feira. Eu a recebi por um telefonema do Scorsin falando dum acidente sem mencionar a morte, certamente para amenizar o impacto, mas sugerindo que fôssemos a Curitiba para lá aguardar notícias mais detalhadas.
Em Curitiba a casa de meu irmão Mussi ficou de portas abertas para receber todos os familiares e amigos, com os telefones no aguardo das notícias, agora sobre o transporte do corpo, uma vez que o falecimento já era do conhecimento de todos. Enquanto aguardávamos não fazíamos ideia do trabalho exaustivo da equipe comandada por Sílvio Galdino para, movendo céus e terras, colocar o corpo, já cumpridas todas as formalidades legais, no avião que levantaria voo de retorno a Maputo, dando por finda a parte que a eles cabia na triste tarefa.
Finalmente a notícia aguardada. O corpo chegaria ao Aeroporto Afonso Pena na manhã do dia 15 de julho, um sábado. Dirigimo-nos ao aeroporto, sentamo-nos na sala de espera aguardando a chegada do avião da Varig. Difícil descrever o meu estado emocional naquele momento. Cheguei a ver a urna funerária sendo descarregada. Dali seguimos para o cemitério Iguaçu onde o corpo seria velado e dado á sepultura às cinco horas da tarde. Atendi, desse modo, a solicitação de minha nora Cristina, para sepultar o corpo em jazigo pertencente à família dela pois havia a alternativa de sepultá-lo em Morretes. Por um desses enigmas da natureza humana consegui manter-me sereno durante o tempo do velório e sepultamento. Alguns quadros por mim presenciados fixaram-se em minha retina e até hoje, ao evocá-los, a emoção me umedece os olhos. Destaco dois deles: a chegada de coroas de flores enviadas por associações de moradores de bairros pobres de Curitiba, beneficiados pelos mercadões populares, que tinham no Maurício um dos articuladores e outro, à beira do jazigo, onde o corpo do pai estava sendo depositado, meus netos Leonardo e Gustavo, com 8 e 6 anos respectivamente, lançando sobre a urna  funerária pequenos ramalhetes de flores.
Ao lado do representante do Governo de Moçambique, este com semblante triste mas postura firme, durante as exéquias, Joaquim Severino  inconsolável, pranteando aquele com o qual era ligado, não apenas pela relação de trabalho mas também por solida amizade de anos e anos. Misturados ao grande número de pessoas presentes, amigos de Morretes, solidários conosco naquele momento difícil.
Encerro aqui a presente edição sobre o assunto que comporta reflexões que se aprofundaram nestes 23, quase 24 anos, já decorridos, daqueles acontecimentos com muitos episódios não divulgados nesta publicação, mas que espero fazê-lo nas próximas.
   
Obrigado pela atenção caríssimos leitores e até a próxima.
   
Prof. Nazir