quarta-feira, 29 de junho de 2011

RECANTO FRATERNO (III)

Quando o Recanto Fraterno começou a ser construído, em 1945, portanto há sessenta e seis anos, a Previdência Social ainda engatinhava. A viuvez, principalmente de mulheres, obrigava a família remanescente a enfrentar grandes dificuldades para sobreviver. Quando se tratava de viúva oriunda do meio rural, maiores ainda eram as dificuldades. Por isso, o Tone, de quem já falei em páginas antecedentes, muito sensível aos problemas de famílias que perderam seus arrimos e que por isso ficaram em situação de pobreza extrema, começou a construir pequenas casas de madeira, com dimensões pouco menores do que as atuais casas de alvenaria do Recanto, mas com o mesmo número de peças a fim de abrigar ali pessoas que ele sabia estarem vivendo momentos difíceis. Assim, de uma em uma, as casas foram sendo construídas, e à medida que ficavam prontas eram imediatamente ocupadas até que, preenchendo todos os espaços atingissem o número de quinze. As pessoas eram atendidas únicamente pela situação social  de necessidade extrema, idependentemente de sexo e idade e quando lá passavam a morar tinham na casa condições totais de sobrevivência  pois  executavam  nela todas as tarefas domèsticas à exceção  dos sanitários,   banheiros e lavanderias, realizadas dentro da instituição em instalações coletivas. A alimentação  era  provida pelo trabalho remunerado que os asssistidos que ainda tinham forças realizavam na comunidade, complementada pelos donativos que a instituição recebia e distribuía.
            Por muitos anos a assistência social na União Espírita Jesus Maria José era assim realizada. A certa altura, num tempo que não posso precisar, Tone, desejando beneficiar a instituição com verbas federais, foi aconselhado a registrá-la no então Conselho Nacional de Assistencia Social. Teria, no entanto, que fazê-lo, de forma específica, isto é, para uma classe de assistidos. Foi assim que surgiu o Asilo à Velhice Desamparada de Morretes que, apesar da denominação, continuou a trabalhar com uma clientela generalizada :-adultos, crianças e idosos de ambos os sexos.


Com a entrada em vigor da Lei n° 10741 de 1°/10/2003,com o Registro no C.N.A.S. como estabelecimento asilar para idosos, com o recebimento de uma verba federal  razoável no início mas que com o tempo foi drasticamente diminuída pela  inflação, pela diminuição também drástica do número de internos devido ao descarte de outros clientes e a exclusividade dos idosos, mais exigentes e não admitindo a morar nas casas senão sozinhos, com a pressão das autoridades principalmente as sanitárias para que o estatuto do idoso fosse rigorosamente cumprido, sentimos que a instituição tornara-se inviável e que  não teríamos outra alternativa senão encerrar suas atividades. Temendo o impacto da medida, principalmente porque  o Recanto, no seu aspecto externo era muito bonito e admirado pelos que,   sem conhecer os problemas legais e de outras naturezas que a entidade   enfrentava, dificilmente  entenderiam o porquê da medida. Por essa razão, na primeira decisão do Conselho Deliberativo decidiu-se a extinção gradativa, isto é, na medida que houvesse desocupação, por motivos comuns, não haveria preenchimento das vagas abertas. Conforme já comentei em postagem anterior de nada adiantou, houve uma verdadeira rebelião interna contra o fechamento apesar de a medida ter sido aprovada por unanimidade pelos sete membros do Conselho Deliberativo, na reunião do dia dezenove de junho de dois mil e oito. Apesar dos incidentes e de seus desdobramentos que serão objeto de meus comentários na próxima postagem, deixa o Recanto Fraterno, enquanto funcionou, maravilhosos registros sobre o atendimento a pessoas carentes, de belas histórias de altruísmo demonstrado pelas pessoas atendidas em favor de outrem. Conforme já disse linhas atrás, terei oportunidade de contar cada um dos episódios que vão  demosnstrar que  os necessitados também se doam em favor de outros que, como eles, dependem de ajuda alheia.
            Até a próxima.
           José Daher
           
       

quinta-feira, 16 de junho de 2011

RECANTO FRATERNO(II)

                   Prossigo falando do Recanto. Parei no ponto em que foi  nomeada  diretora do Recanto Fraterno, a Sra Maria Angélica Accioly Gomes, pelo então presidente Pedro Martim Teixeira,em  substituição ao diretor demissionário. A nomeação em caráter provisório, tinha por finalidade todos os procedimentos  necessários ao processo de desabrigação dos internos.
                   Em seu relatório, a nova diretora fez uma análise da situação em que viviam os idosos do Recanto Fraterno verificando, pelos dados colhidos, que a instituição não se adequara ao Estatuto do Idoso. Pelo horário cumprido pelas duas funcionárias que lá prestavam seus serviços, os idosos ficavam sozinhos   após às 19,00 horas até às 8,00 horas do dia seguinte e nos sábados, após às 13 horas até às 8,00 horas de segunda-feira, não  permanecendo ninguém nos domingos. Ressaltava ainda  que os idosos,  quando  saiam do Recanto ou nele entravam, faziam-no sozinhos e sem hora para retorno. Diante da situação a nova Diretora depois de se reunir com a Vice Presidente e outros membros da Diretoria e de tomar conhecimento de que ninguém se dispusera a assumir o Recanto, optou pelo reinserção familiar e nos casos da impossibilidade dessa medida, o encaminhamento para a Sociedade de Assistência aos Necessitados(abrigo dos Velhos) em Paranaguá, a qual conta com uma estrutura melhor e mais adequada  a  atual legislação. Segundo o relatório, dos doze abrigados nove foram encaminhados para as famílias(naturais ou adotivas) e apenas três foram encaminhados à entidade de Paranaguá. Constou ainda do relatório que  o processo de desabrigamento foi devidamente  divulgado no Jornal  Morretes Notícia, edição n° 29, com o intuito de demonstrar transparência e esclarecer e comunicar a população local acerca das mudanças e ações ocorridas no Recanto Fraterno pois a divulgação de todos os procedimentos é de fato dever da instituição, já que se trata de uma organização sem fins lucrativos.
                   A relatora encerra o seu trabalho elucidando a relevância do acompanhamento de todos os idosos reintegrados às famílias ou encaminhados para a instituição de Paranaguá, a fim de garantir a integridade física e mental deles bem como o apoio psicossocial no período de transição.
                     Aqui se encerra o relato que abrange a fundação, funcionamento e encerramento das atividades do Recanto Fraterno como instituição asilar para idosos. Na próxima postagem volto ainda ao assunto para considerações a  respeito dessa atividade e de outras l sobre assistência social nos Centros Espíritas.  Até lá.
                       José Daher        
                          
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sábado, 4 de junho de 2011

RECANTO FRATERNO (I)

 

 Fundado em 1945, funcionando regularmente até 2009, o Recanto Fraterno prestou, durante os 64 anos de suas atividades, inestimáveis serviços à comunidade morretense. Com a denominação inicial de Asilo à Velhice Desamparada de Morretes, funcionou, na sua fase inicial, muito mais como um pronto socorro social do que propriamente como asilo de idosos. Enquanto a Lei n° 10.741, de 1° de outubro de 2003, que criou o Estatuto do Idoso, não definiu as regras para o ingresso e permanência dos idosos nas instituições, o atendimento generalizado nos permitiu acolher no Recanto mães e filhos em situação difícil, gente jovem cuidando de familiares inválidos, famílias como o caso de Ana da Silva que tinha um marido cego e uma filha portadora de doença que paralisou totalmente o seu desenvolvimento permanecendo a criatura até os quarenta e seis anos na condição de um bebê. Sobre essa comovente história escrevi matéria jornalística que foi publicada no Jornal do Leste, quando aquele órgão circulou na década de 90 sob a direção do competente e grande amigo Gilberto Gnoato.   Estas e outras histórias acontecidas no Recanto deverão figurar neste blog, numa série com o título “Histórias do Recanto”.
                        Para melhor compreensão divido a história do Recanto em duas etapas distintas. A primeira vai da fundação em 1945, até o advento da lei n° 10741, de 1° de outubro de 2003. Nesse primeiro período, apesar de constar na sua denominação a palavra “velhice”, o Recanto não tinha uma clientela fixa. Atendia indistintamente adultos, crianças e idosos, de ambos os sexos, bastando que fossem necessitados e estivessem  constituídos em uma família. A segunda etapa iniciou-se quando o Estatuto do Idoso, transformado em lei e implantado no país a partir de 2003, particularizou o atendimento exclusivamente ao idoso e pelo seu rigor inviabilizou a continuidade do Recanto como instituição asilar para idosos. O ato de extinção foi então decidido na reunião do Conselho Deliberativo da União Espírita Jesus Maria José,  acontecida no dia dezenove de junho de dois mil e oito. Optou-se pela extinção gradativa, isto é, à medida que os internos,  pelos mais variados motivos fossem deixando a instituição, as vagas que se abririam não seriam preenchidas com novas admissões. Além disso, não seria uma extinção pura e simples e sim uma substituição do asilamento para idosos por outras modalidades de assistência direcionadas à educação, profissionalização e promoção social   dos assistidos .
                        Planejada para acontecer de forma natural e na impossibilidade de prever quando as desocupações das casas terminariam, permitindo a extinção do asilamento, procurou-se cumprir, na medida do possível, o que o Estatuto exigia. Desse modo, foi montada uma cozinha coletiva onde todos os internos passaram a fazer as refeições, e firmaram-se contratos de prestação de serviço com cada um dos internos em obediência ao que preceitua o Art. 35 e seus parágrafos da lei que criou o Estatuto. Essas duas medidas geraram muitas reclamações pois os idosos estavam acostumados a preparar as refeições na cozinha que cada casa possui. O contrato de prestação de serviço estabelecia uma contribuição monetária de até 70 % do benefício que cada idoso recebia como aposentado ou pensionista. Passamos a a cobrar 50% e assim mesmo as reclamações foram muitas.
Vencendo todas as dificuldades para caminhar em direção à meta que era a substituição do asilamento de idosos por outras modalidades de assistência, um trabalho conjunto realizado pela direção do Recanto Fraterno e pela Diretoria Executiva da União Espírita Jesus Maria José, uma dificuldade maior e insuperável surgiu. Contrariando aas decisões tomadas na reunião realizada no dia 19 de junho de 2008, a Direção do Recanto Fraterno admitiu, ou, melhor dizendo, readmitiu dois ex-internos num momento em que a extinção estava em curso. Pior ainda foi a manifestação verbal dos dirigentes do Recanto de que a desativação não mais seria levada a efeito. Os motivos alegados foram de ordem sentimental que respeitamos e até louvamos. Mas, em contraposição defrontávamo-nos com os rigores da lei que enquadrava como crime de responsabilidade para a instituição e para os dirigentes em caso de acidente fatal que ocorresse com qualquer dos idosos. Isso poderia acontecer pois os idosos, morando em casas individuais e sozinhos poderiam sofrer uma queda ou um mal súbito durante a noite sem a vigilância de um cuidador. Com uma instituição totalmente desaparelhada para emergências dessa natureza os riscos seriam constantes e iminentes. O caminho, face aos acontecimentos, não poderia ser outro senão a extinção, não mais gradativa mas imediata o que aconteceu na reunião do Conselho Deliberativo  realizada no dia 10 de dezembro de 2010.
                        Na mencionada reunião, o Diretor e o Diretor Auxiliar do Recanto entregaram ofício ao presidente participando o afastamento de ambos de seus cargos. A  pedido do então Presidente, Sr. Pedro Martim Teixeira, assumiu o cargo de Diretora do Recanto Fraterno, em caráter provisório e para fins de desabrigamento, a Sra. Maria Angélica  Accioly Gomes. Mas isso é assunto para a próxima postagem deste blog cujo título será Recanto Fraterno (II). Até lá.
                      José Daher