quarta-feira, 11 de maio de 2011

NO ENSEJO DO “DIA DAS MÃES” (II)

            Em 1993 fui presenteado com um livro enviado por um grande  amigo meu, o  Sr. Lycurgo Negrão, um morretense que subiu o planalto e há muitos anos mora em Ponta Grossa. O livro se intitula “Momentos de Ouro” , foi psicografado pelo nosso amado Chico Xavier, abriga trinta e três produções literárias em prosa e verso, de autores  espirituais também diversos. Selecionei uma delas, uma verdadeira jóia, para com ela  presentear os meus leitores,. A autora, Maria Dolores, pseudônimo de Maria de Carvalho Leite, poetisa baiana nascida em 10/09/1900 e desencarnada em 27/08/1952,  destacou-se pela atividade intelectual e pelo trabalho social que realizou. Várias biografias dela podem ser encontradas no “Geogle” mas eu sugiro aquela  oriunda da Revista Espírita “O Consolador” que é mais detalhada.


RETRATO DE MÃE

                                                                                              Maria Dolores
Depois de muito tempo,
Sobre os quadros sombrios do Calvário,
Judas, cego no Além, errava solitário...

Era triste a paisagem,
O céu era nevoento

Cansado de remorso e sofrimento,
Sentara-se a chorar...
Nisso, nobre mulher de planos superiores,
Nimbada de celestes esplendores,
Que ele não conseguia divisar,
Chega e afaga a cabeça do infeliz.
Em seguida, num tom de carinho profundo,
Quase que, em oração, ela lhe diz:
- Meu filho por que choras?

Acaso não sabeis? – replica o interpelado
Claramente agressivo,
Sou um morto e estou vivo ,
Matei-me e novamente estou de pé,
Sem consolo, sem lar, sem amor e sem fé...
Não ouviste falar em Judas, o traidor?
Sou eu que aniquilei a vida do Senhor...
A princípio julguei fazê-lo rei,
Mas apenas lhe impus
Sacrifício, martírio, sangue e cruz.
E em flagelo e aflição
Eis a que minha  vida agora se reduz...
Afastai-vos de mim,
Deixai-me padecer neste inferno sem fim...
Nada me pergunteis, retirai-vos senhora,
Nada sabeis da mágua que me agita,
Nunca penetrareis minha dor infinita...
O assunto que lastimo é unicamente meu...

No entanto, a dama calma respondeu:
- Meu filho, sei que sofres, sei que lutas,
Sei a dor que te causa o remorso que escutas,
Venho apenas falar-te
Que Deus é sempre amor em toda parte...
E acrescentou serena:
A Bondade do Céu jamais condena;
Venho por mãe a ti, buscando um filho amado,
Sofre com paciência a dor e a prova...
Terás em breve uma existência nova...
Não te sintas sozinho ou desprezado.                        

Judas interrompeu-a e bradou, rude e pasmo:
-Mãe? Não me venhas aqui com mentira e sarcasmo,
Depois de me enforcar num galho de figueira,
Para acordar na dor,
Sem mais poder fugir à vida verdadeira,
Fui procurar consolo e força de viver
Ao pé da pobre mãe que me forjara o ser!..
Ela me viu chorando e escutou meus lamentos
Mas teve medo de meus sofrimentos.
Expulsou-me a esconjuros,
Chamou-me monstro, por sinal,
Disse que eu era
Unicamente o espírito do mal;
Intimou-me a terrível retrocesso,
Mandando que apressasse meu regresso
Para a zona infernal, de onde, por certo, eu vinha...
Ah! detesto lembrar a horrível mãe que eu tinha...
Não me faleis de mães, não me faleis de amor,
Sou apenas um monstro sofredor...
Inda assim – disse a dama docemente –
Por mais que me recuses não me altero;
Amo-te, filho meu, amo-te e quero
Ver-te, de novo, a vida
Maravilhosamente revestida
De paz e luz, de fé e elevação...
Virás comigo à Terra,
Perderás, pouco a pouco, o ânimo violento,
Terás o coração
Nas águas de bendito esquecimento.
Numa nova existência de esperança,
Levar-te-ei comigo
A remansoso abrigo
Dar-te-ei outra mãe! Pensa e descansa!...

E Judas, nesse instante,
Como quem olvidasse a própria dor gigante
Ou como quem se desgarra
De pesadelo atroz
Perguntou: - quem sois vós?
Que me falais assim sabendo-me traidor?
Sois divina mulher,irradiando amor
Ou anjo celestial de quem pressinto a luz ?!

No entanto, ela a fitá-lo, frente a frente,
Respondeu simplesmente:
-Meu filho, eu sou Maria, sou a mãe de Jesus.

                       

segunda-feira, 2 de maio de 2011

NO ENSEJO DO “DIA DAS MÃES” (I)




                

        No ensejo do Dia das Mães eu quero falar da minha. Dona Estelita que de registro de nascimento foi Rosa mas que ganhou esse carinhoso apelido graças à minha avó Joaquina, repetiu comigo o que aconteceu com ela:   começou a me chamar de Nazir quando de registro eu sou José. E pegou. Tudo bem, não só o apelido dela não a atrapalhou em nada, podendo eu dizer o mesmo em relação ao Nazir, nome pelo qual todos me conhecem.
Tivemos o privilégio, eu e meus  irmãos  de tê-la conosco até dezembro de 2008 quando ela fechou os olhos para o mundo da carne faltando apenas quatro meses para completar 103 anos.
        Recordo quando a família toda ainda morava em Morretes. Nossa casa tinha as portas sempre abertas para os adultos, amigos de meus pais e para os da ala jovem amigos nossos, os filhos. Muito bom recordar aquele tempo, com ricas passagens de demonstração de amizade, tanto da parte de nosso pai que trazia do meio árabe, donde provinha, uma tradição de hospitalidade. Mas era da parte de d. Estelita a maior solicitude com todos os que conosco conviviam nas muitas visitas que  recebíamos.
        Passo para os leitores a mensagem abaixo, expedida para a festa familiar comemorativa dos 100 anos dessa criatura extraordinária que aqui na terra me acolheu como filho.




OS 100 ANOS DE DONA ESTELITA
Mensagem do Prof. José Daher, na festa comemorativa, realizada na residência da família, no dia 14 de maio de 2006.

Mãe:

            Não estranhes  que eu  use a linguagem escrita para  dizer o quanto me alegro pela data de hoje.  A boa visão e a possibilidade de ler são os recursos preciosos com que a Bondade Divina te premiou, compensando a falta do órgão  auditivo, desgastado pela longa jornada existencial.
         Por isso, utilizando–me deste meio, estou  muito à vontade para te dizer, o quanto me sinto  feliz por ter o privilégio de contar com tua presença neste centenário de teu nascimento, e estou certo que assim pensam e sentem todos os demais familiares que  aqui se encontram, participando deste tão significativo encontro. E  quando falo em familiares, incluo o nosso querido caçula(*) que antecipou–se a nós na viagem que todos teremos que empreender um dia, deixando–nos saudosos e com a sensação de um imenso vazio. Anima– me  no entanto, a certeza de que ele, que era presença obrigatória em todas as reuniões familiares,  tornando   o ambiente  sempre agradável com a sua  contagiante alegria, está hoje conosco,  participando de nossa festa..
         Então mãe, se  os nossos olhos verterem lágrimas – e às vezes não há como estancá–las –  que elas sejam  de saudade ou de alegria, nunca de inconformação ou desespero. Afinal,   aqueles que nos deixaram são apenas ausentes, aguardando o     reencontro num tempo para nós impreciso, mas que acontecerá um dia, e nos devolverá a alegria de novamente  conviver com os que amamos, e que temporariamente nos deixaram.      .        
            Numa jornada centenária como a que empreendeste, pudemos nós, teus filhos, testemunhar  as tuas lutas, teu sacrifício, tua abnegação que te promovia à condição de verdadeira heroína, atuando anonimamente no recesso de nosso lar.
         Como companheira fiel  e como a mãe dedicada que sempre foste, coadjuvavas nosso pai nos cuidados em relação à prole,  mas, na verdade,  eras  tu quem conduzias, com firmeza e  serenidade  a nau familiar,  ora navegando em águas tranqüilas, ora  enfrentando  a agitação das borrascas.
           Depois, cada um de nós foi construindo sua  autonomia, o que   não impediu que buscássemos,  em tua companhia, em todas as oportunidades que se ofereciam, o aconchego, a expressão serena e bondosa, com que nos recebias,  capaz de acalmar as tempestades da alma, a que cada um de nós, pelas contingências da vida, estamos sujeitos.
           Mãe, perdoa–nos  se  expressamos o desejo de que  permaneças  conosco ainda por  muitos anos, contrariando a tua vontade  que é  a de  encerrar a tua jornada neste mundo  em breve tempo, porque o corpo está cansado e desgastado.    Deus, em sua infinita sabedoria, se assim dispõe, é porque a tua permanência aqui,  por útil e valiosa, é ainda indispensável, principalmente para nós, que temos em ti,  os elos de uma corrente que nos mantém unidos e solidários.
           Dá–nos a tua bêncão e deixe  que reverenciemos a tua figura de santa, juntando nossas mãos em prece de agradecimento pelo tesouro que a Bondade Divina nos permite conservar, que é a tua veneranda  presença junto de nós.
            Beijos do
             Nazir


(*)  Mussi, nosso irmão caçula, faleceu no mês de junho de 2004.