sábado, 30 de julho de 2011

RECANTO FRATERNO (IV)


                Pretendendo encerrar a série “Recanto Fraterno”, mas com o propósito de voltar ao assunto quando a necessidade de novos esclarecimentos o exigir, quero tecer as considerações finais sobre a assistência social praticada na União Espírita Jesus Maria José.  
            Na longa trajetória que a nossa querida entidade percorreu, desde os idos de 1945 até fins de 2009, foram, em nome da caridade, mantidas residências para a moradia de pessoas necessitadas em geral, num primeiro período, e de idosos exclusivamente, no período posterior e último.
           Desde a década de 80 a assistência social  vem experimentando grandes mudanças .Dentre essas, o regime de internamento para idosos e crianças, que já era discutível, até mesmo antes daquela época, com o passar do tempo acabou se tornando obsoleto.   “Lugar de criança e de idoso é, prioritariamente junto à família.”
          Quando, em 1975, recebemos do então existente Instituto de Assistência ao Menor, uma proposta  para que mudássemos o regime do Retiro Fraterno de Meninos, de internamento para semi-internamento, aceitamo-la. O argumento era convincente. Assistiríamos as crianças sem separá-las das famílias. Foram, pelo próprio Instituto,  recolhidos os internos que lá se encontravam, quase todos trazidos de fora (pouquíssimos de Morretes) .  Abrimos inscrições para crianças de Morretes e o número dessas inscrições passava de 40.  Vencemos as dificuldades, uma delas a distância, pois o Retiro se situava a dois quilômetros da cidade. Com a adaptação de uma carreta para transformá-la em bondinho (ônibus, naquele tempo, era impensável) que acoplado  a um trator que possuíamos fazia a condução das crianças, mais uma verba que o Instituto acrescentou ao per capita  dos futuros semi-internos para pagarmos uma professora a fim de  proporcionar atividades aos pequenos no contra-turno (período em que os alunos não estão na sala de aula].  Enfim tudo providenciado a instituição começou a funcionar sob o novo regime. No começo, tudo bem. Mas depois de algum tempo,  o inesperado. A freqüência das crianças começou a baixar e em alguns dias menos de um terço delas comparecia. E aí revelou-se outra  realidade. De nada adianta dar assistência à criança se não se assistir igualmente à família dela. A carência da criança decorre da carência  da família. Como não tínhamos condições de atender a este outro segmento, e continuar naquelas condições, significava um desperdício de recursos financeiros e humanos, ante o quadro de inviabilidade que se formou, tivemos que desativar a instituição.
Quando falei linhas acima das grandes transformações sofridas pela assistência social a partir da década de 80, posso definir como resultado delas as palavras de ordem : integração e promoção social. De fato quando se dá assistência à família carente, fragmentada pela pobreza e pela ignorância, e perseguimos a meta da promoção social integrada, envolvemos toda a família, inserindo por força disso, crianças e idosos que dela fazem parte.
            Quando o Retiro ainda funcionava nas décadas de 60 e 70, o Lar Fabiano de Cristo, instituição de âmbito nacional dirigida por espíritas, montou em Antonina um conjunto de casas a que denominaram “colmeia”. Eram cinco  moradias cada uma delas com capacidade para  10 crianças  e mais um casal social.  Já era um avanço em relação aos orfanatos convencionais.  No entanto, em visita recente a Antonina, para saber como se encontrava a colméia, deparei, no portão de acesso, com um guarda municipal. Ele me informou que a colmeia tinha sido desativada há anos e que ali funcionava agora uma creche mantida pela Prefeitura de Antonina. As cinco casas que faziam parte da unidade ficaram vazias e estão sendo  utilizadas presentemente, em caráter provisório, para abrigar famílias que perderam seus lares em conseqüência das chuvas e deslisamentos ocorridos no início do ano. Conclusão a que cheguei. O sistema de colméias que, ao tempo em que funcionou, era avançado em relação ao que então existia, também se tornara  anacrônico face aos outros avanços realizados no setor. Esses avanços de acordo com algumas pesquisas que me foi dado realizar estão expressos na Metodologia em Assistencia Social que consta no portal da Instituição e da qual transcrevo aquilo que entendo como essência: “O Lar Fabiano de Cristo desenvolveu sua metodologia em assistência social transformando suas Casas Assistenciais (CA) em Unidades de Promoção Integral(UPI).  Como a entidade é de âmbito nacional existem UPIs em número significativo em vários estados brasileiros. Uma em nosso Estado.
Mas voltemos agora a falar da nossa Casa. Como toda a  casa Espírita, ao ser fundada em 3 de outubro de 1935,a União Espírita Jesus Maria José deveria, seguindo o modelo do primeiro Centro Espírita do Mundo, a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, fundada por Allan Kardec em 1° de abril de 1858, dedicar-se prioritariamente à divulgação da Doutrina. A assistência Social de ordem material( distribuição de alimentos, roupas, enxovais para bebês,  teto para pessoas em situação de miséria, é inegavelmente louvável ,mas  exige certos cuidados como impedir o crescimento desmedido, superior à capacidade administrativa e financeira da casa. Quando isso acontece, o empenho na divulgação da Doutrina fica prejudicado pela mobilização de preciosos recursos de mão de obra e financeiros, absorvidos pela atividades  assistenciais. Em nossa instituição a coisa foi mais longe. Quando se tentou corrigir essa distorção, a reação foi de tal ordem que atingiu as raias da violência, graças a Deus apenas verbal, mas que provocou a renúncia de vários conselheiros ficando a nova diretoria então eleita, de tal modo desfalcada, que foi muito difícil a recomposição. Os trabalhos doutrinários só não sofreram interrupção graças à  U.R.E. –(União Regional Espírita) que congrega todas as casas espíritas do Litoral, e cujo apoio foi importante e decisivo,   bem como os trabalhadores remanescentes que envidaram louváveis esforços para dar continuidade às atividades normais da Casa.
O que vimos nesse episódio?  O assistencialismo(forma equivocada de assistência social que dá sem promover)  batendo de frente com a atividade doutrinária, dividindo os trabalhadores da Casa e abalando suas estruturas, chegando a  por em risco o seu normal funcionamento, tudo em nome da caridade material que, no enfoque espírita, é apenas um dos aspectos da caridade, com certeza o menor deles.
            Vejamos agora o que é caridade no conceito espírita-cristão estudado na questão 886 de O Livro dos Espíritos: Qual o verdadeiro sentido da palavra caridade como a entendia Jesus? E a resposta dos Espíritos Superiores: Benevolência para com todos, indulgência para com as imperfeições dos outros, perdão das ofensas.
   Fica evidente que o conceito de caridade é muito mais abrangente, não se limita ao atendimento aos que tem fome de pão mas também aos carentes de amor, que  se encontram em todas as camadas sociais. 
            Para nossa reflexão transcrevo alguns   conceitos emitidos no capítulo de apresentação do livro “Fora da Caridade não há Salvação” de autoria do  confrade Alírio de Cerqueira Filho:
“Em nosso movimento espírita confunde-se, ainda, a caridade com o assistencialismo. Estudaremos o significado real da caridade e como podemos aplicá-la no SAPSE(Serviço de Assistência e Promoção Social Espírita).
É fundamental que o movimento espírita, em pleno século XXI, resignifique as suas práticas, de modo que possamos aproximar o movimento dos postulados básicos da Doutrina Espírita.
Muitas atividades assistencialistas ainda tem sido desenvolvidas em nome da caridade, como se fossem atividades promocionais do espírito imortal; mas que, se analisadas com critério, muitas vezes concorrem para viciações muito difíceis de ser superadas. Essas atividades não se coadunam com o objetivo principal da Doutrina Espírita, que é a  promoção da criatura a uma posição de maior evolução.”
            Amigos, mil perdões. Reconheço que me estendi demais. É que o assunto é palpitante, comporta muitos esclarecimentos, por isso não descarto a possibilidade de voltar a ele em futuras oportunidades com outros títulos. Obrigado pela atenção. Até outra.
            Prof. Nazir