sábado, 26 de janeiro de 2013

LYCURGO DESPEDIU-SE


          Aconteceu no apagar das luzes de 2012, mais precisamente no dia 29 de dezembro próximo passado. A notícia só nos chegou no dia 21 deste mês transmitida pelo companheiro de Doutrina Marcelo, que a trouxe de Ponta Grossa, onde Lycurgo residia. Para confirmação e detalhes liguei para a residência situada no bairro de Uvaranas. Atendeu-me dona Jaqueline, a senhora que, com muito carinho cuidava dele. Ainda emocionada contou-me ela que os sintomas que levaram Lycurgo ao internamento, indicavam um mal de maior gravidade do que o edema em uma das pernas, que lhe tolhiam os movimentos, e para o qual estava recebendo tratamento. Dona Jaqueline, pedindo ao médico que dele cuidava, que traçasse o quadro real indicativo do estado de saúde do querido enfermo, ouviu o diagnóstico: câncer no fígado. Nada a fazer senão dar-lhe toda a assistência até a hora do desenlace. "Morreu nos meus braços" disse-me ela sem poder conter o choro. Desculpou-se por não ter me comunicado o falecimento, pois, procurando entre as anotações do Sr. Lycurgo não encontrou o número de meu telefone.
          Foram 96 os anos da última existência física desse morretense, dedicado às letras, à Doutrina Espírita, à assistência social, à família que ele constituiu com filhos adotivos, aos amigos entre os quais, privilegiado me incluo, mas sobretudo uma alma boníssima. Certamente o plano espiritual te-lo-á recebido com muito júbilo, enquanto que nós, agora saudosos, guardaremos a lembrança de uma presença muito marcante pelas virtudes e pelo grande coração, marcas registradas do Lycurgo.
          Em sua homenagem, transcrevo aqui, dois trabalhos poéticos que fariam parte do livro que já tinha título, "Fogo de Chão", mas que não chegou a ser editado:




Pergunto aos meus conterrâneos 
No meu jeito de assuntá, 
Dos morros morreteanos 
Quem conhece o Sarapiá

Conhecê tem pouca gente 
maioria ouviu falá, 
mas, dos poucos que conhecem 
vem coisa que vou contá

Só não sei se bem contado 
ou se dá pra acreditá, 
no entanto é coisa nossa 
tem jeito de averiguá
  
Redizem os que conhecem 
tal e qual vou recontá, 
que caboclo pinta braba 
não pisa o Sarapiá.
  
Se pisá o morro apincha 
não adianta arrevesá, 
valentão vira caguincha 
morro abaixo a trambecá. 

Portanto meus conterrâneos 
Este é o morro Sarapiá, 
E os informes consentâneos 
Para no morro chegá.

Quem não tiver qualidade 
Não provoque o Sarapiá 
Pois desinfelicidade
É ser pinchado de lá.
                                                                                 
Nota do autor: Página calcada numa historieta de Marciano Ribeiro de Campos, anhaiense gandavo,* famoso pelas suas porandubas** e marandubas.***
*Gandavo: bras., contador de histórias e fábulas.Mentiroso. ** poranduba: história, notícia, relação. Palavra de origem Tupi. *** maranduba: também de origem Tupi significa história de guerra. Bras., história inverossímil ou fabulosa.
Nota do redator: O trabalho acima foi publicado na Antologia n° 2 da Academia de Letras dos Campos Gerais, editada em 2003. Lycurgo ocupava na Academia a cadeira n° 2 com o pseudônimo Porthus Mariani.


BALOUÇOS DE FLOR AO VENTO 
NA VERDEJANTE RAMADA, 
MINHA GENTE É CUMPRIMENTO 
DA MANHÃ ENSOLARADA

TUDO NA VIDA ENVELHECE 
AQUI, ALI, ONDE FOR, 
MAS UMA COISA ACONTECE 
NUNCA ENVELHECE O AMOR

QUANDO A SAUDADE ALVOROÇA 
AS COISAS DO CORAÇÃO, 
FICA TRISTE A MINHA CHOÇA
AUMENTANDO A SOLIDÃO

OS PINHEIROS MEDITANDO 
NAS HORAS DO ENTARDECER
PARECEM MONGES REZANDO 
PELO SOL QUE VAI MORRER

O SOFRIMENTO INFLIGE 
A MALDADE E O MALFEITOR 
MAS, QUEM PERDOA E CORRIGE 
É O CANSAÇO E O AMOR

QUANDO A MORTE FOR CHEGANDO 
OLHE BEM SEM SE ASSUSTAR 
                                          DOUTRO LADO PRA VOLTAR
É A PRÓPRIA VIDA CHAMANDO 



Nota do redator: o trabalho acima foi publicado na Antologia n° 3 da Academia de Letras dos Campos Gerais, editada em 2005.

              Voltarei a falar de Lycurgo em oportunidades futuras. Seus trabalhos, não só em versos, mas também em prosa, estão a minha disposição em arquivos que organizei para abrigar os que me foram enviados por ele durante os períodos em que nos correspondemos.
                     Até a próxima.
                                                                                           Prof. Nazir